Olá a todos,

Agradeco pelas respostas. A universidade aqui (estou no México) está  
em seu (extenso) recesso de verao, nao tinha ninguém pra bater bola,  
foi bom bater bola com voces.

Walter: obrigado pelos comentários e pelo material. Seu aluno Anderson  
também me mandou alguma coisa, já o agradeci também. Vou comentar algo  
da sua resposta:


Quoting Walter Carnielli <walter.carnie...@gmail.com>:

> Caro Samuel:
>
> o que você  levanta  são  questões  profundamente  interessantes.
>
> Envio  a voce em separado (parece que a  Lista não aceita o arquivo)
> um prefácio de  Robert Vaught sobre  o "review" que Gödel publicou
> sobre os trabalhos de  Skolem de 1933 e 1934 (dos quais
> Gödel  diz que "são  praticamente os mesmos"). Isso aparece nos
> "Collected Works" vol I, editado  S. Fefermann, pp. 376-379, que são
> as  páginas que envio.
>
> O texto contem a resenha que você   procura, e ainda a importante
> opinião  de  Vaught.
>
> Aparentemente Gödel  não viu que a existência dos modelos não standard
> segue do Teorema da Compacidade (que ele mesmo  demonstrou em 1930!).
> Como Vaught nota na  pag. 377, Gödel afirma que  tais modelos
> não-standard seguiriam do seu Teorema de Incompletude (o que não é
> incorreto da maneira que Gödel coloca, mas  não revela a  razão
> principal).
>
> Dou aí abaixo algumas   opiniões  sobre  o que você pergunta   (mas
> não são  mais que opiniões-  não me  considero nenhum "especialista"
> sobre o assunto--de resto, parece que nem Gödel, nem Skolem o
> eram...).
>  **************************************************************
>

----------> Pois é, é um assunto derrapante mesmo, como vc disse depois.

>> "Suponha PA consistente. Entao, pelo Primeiro Teorema de Incompletude,
>> PA nao prova a sentenca de Godel G.
>>
>> Segue que PA + ~G é consistente, logo, pelo Teorema da Completude para
>> teorias de primeira ordem, tem modelo.
>>
>> Nesse modelo vale ~G. Entao esse modelo difere do modelo standard, no
>> qual a sentenca de Godel G é verdadeira".
>>
>
>
> Sim, os modelos não- standard suportam  essa situação perfeitamente bem.
>
> **************************************************************
>>
>> Apresento algumas questoes, nao sei se elas sao "bobagem" ou nao...
>>
>> 1) Alguém sabe se este é o argumento de Gödel na tal resenha, ou se
>> ele usou esse argumento depois ?
>
>
> Não usou, e  acho  (mas  não  tenho certeza) que   Gödel  nunca  usou
> este argumento. Mas  nos trabalhos contemporâneos  acredito  que isso
> já  seja "folclore".
>

------------> Estou sem o meu Kleene aqui, mas na página 377 do Review  
que vc me mandou o Vaught diz que na página 430 do Kleene tem um  
comentário sobre o argumento de Gödel, e penso que deve ser algo  
parecido mesmo, pegar uma A nao provável, olhar para consistencia de  
PA + ~A e aplicar completude.

Mesmo pensando em termos do modelo standard, o Francicleber me mandou  
uma mensagem (a qual também agradeco) lembrando que nao há porque se  
preocupar só com a sentenca de Gödel, pois para qualquer A que nao  
seja demonstrável, teremos uma entre A, ~A será válida no modelo  
standard, e assim teremos uma fórmula válida no modelo standard que  
nao será consequencia sintática de PA e que portanto nao vale em todos  
os modelos, garantindo a existencia dos modelos nao-standard (mas  
passando pelo Teorema da Completude...).




>>
>> 2) Usualmente se diz que "G é verdadeira e nao pode ser demonstrada".
>> Bem, G é (facilmente) equivalente à consistência de PA (o que
>> inclusive já prova o Segundo Teorema de Incompletude).
>>
>> Muitas vezes se diz que "G é verdadeira no modelo standard" (isso
>> aparece inclusive no argumento que eu destaquei acima). Essa afirmacao é
>> intuitiva ou pode ser mesmo formalizada ?
>
> Sim,  pode  ser verificada no modelo standard.



--------> Nao achei nenhuma boa referencia sobre isso, mas deu pra  
entender que a argumentacao usa a nocao de "truth-in-a-model"...  
Essencialmente, a codificacao de Gödel é em cima dos naturais  
standard, e depois de feita a prova, olhamos para as codificacoes e  
checamos que uma certa fórmula com quantificador vale no modelo  
standard (como é semântico, "basta olhar", se fosse sintático teria  
que aparecer algo como \omega-consistência). Essa fórmula é G. OK.



>
>> (sobre esse problema eu vi que se tem uma discussao filosófica
>> interessante, "saber" (ou "ser capaz de deduzir que") que a sentenca G
>> é verdadeira seria uma prova de que a mente humana supera os
>> computadores, isso seria um tal argumento de Lucas/Penrose...)
>
>
> Mas essa  é outra questão-- a propósito, dê   uma  olhada em:
>
> "Why is the Lucas-Penrose Argument Invalid?"  Manfred Kerber,
> http://www.cs.bham.ac.uk/~mmk/papers/05-KI.html
>


--------> Essa questao do argumento de Lucas\Penrose, eu já tinha  
visto que era bem polêmica... Vou ler esse artigo que vc me indicou.  
Trombei na internet com um artigo do Shapiro de nome engracado,  
tratando nao exatamente disso mas de algo relacionado: "A sentenca de  
Godel é verdadeira - mas alguém mudou de assunto ?"




>> 3)(e aqui uma pergunta que se alguém me fizer hoje eu nao sei responder)
>>
>> A sentenca de Godel G é equivalente a Con(PA). Assim, se eu assumo
>> Con(PA), estou assumindo que G é verdadeira. Ela nao deveria entao ser
>> verdadeira em todos os modelos de PA ? Como fica o argumento acima
>> para modelos nao-standard ?
>
> Se eu entendi bem  questão  (essas  coisas são  derrapantes), tudo
> isso vale para o modelo standard de PA. Para  os não  -standard, seria
> outra coisa. Mas  não  há nada de chocante nisso (pelo menos  como eu
> vejo).
>


------> É, aqui eu dei uma derrapda, por falta de experiencia de  
trabalhar com PA (faco argumentos do tipo para ZFC e nunca tive  
problema nenhum !). Como PA nao prova Con(PA), entao, como a  
aritmética, apesar de ser sintaticamente incompleta, é semanticamente  
completa, nao vai ter Con(PA) válida em todos os seus modelos.  
Tranquilo. Devo estar entre os que pensam no Teorema da Completude  
como sendo para LÓGICAS de primeira ordem, sendo que podemos enunciar  
para TEORIAS de primeira ordem... Simplesmente, esqueci de aplicar  
Completude quando fiz a pergunta (3) !!!

"Assumir a consistencia de PA" nao é uma frase "cataclismica" que muda  
a compreensao das coisas, só equivale a dizer que uma certa fórmula  
(ou string de números...) está sendo suposta verdadeira. "Assumir a  
consistencia de PA" é "Estamos trabalhando num modelo onde a sentenca  
de Godel é satisfeita".

Como disse, estou sempre fazendo isso em ZFC. Existem muitas assercoes  
matemáticas equivalente a CH (Hipótese do Contínuo) - uma simples e  
que estou fazendo propaganda é a seguinte: "Se do plano R^2 retiramos  
um conjunto de tamanho aleph_1, o que resta é um conjunto simplesmente  
conexo". "Assumir CH" nao faz com que essa frase sobre o R^2 seja  
verdadeira, "Assumir CH" é trabalhar num modelo em que CH vale (e essa  
frase sobre o plano também).


> Estou trabalhando na questão  da consistência, preparando um artigo
> para  os  "Proceedings" do  evento   "CLE/AIPS - Science, Truth and
> Consistency" (em homenagem
> aos 80 anos do Newton) . Minha proposta, mas  isso leva uma 25
> páginas, é  que há tantas noções de  "consistência" que  o conceito
> axiomatizado (como nas LFI's) deveria ser  levado  a sério, e  teria
> talvez  até modelos não standard!
>
>

------> Bom, depois gostaremos todos de ter acesso ao trabalho !
A nocao de "consistencia nao-standard" deve ser interessante... Grato, Walter.


Décio: meio sem querer, durante a preparacao dessa minha palestra, eu  
acabei me preocupando com essas questoes do tipo que vc levantou, "as  
más interpretacoes" do Teorema da Incompletude. Fora as questoes mais  
óbvias, aplicando incompletude para a Bíblia ou para a Constituicao,  
existem outras mais sutis.

Por exemplo, uma frase que eu já falei para os meus alunos e que nao  
está errada, mas dá a entender algo que nao é lá muito correto:

"O Teorema da Incompletude mostra que existem questoes matemática  
indecidíveis, como por exemplo a Hipótese do Contínuo"

Bem, tem que se tomar cuidado aí. O Teorema da Incompletude mostra que  
existem questoes *aritméticas* indecidíveis. Claro que sao questoes  
matemáticas, mas usar a Hipótese do Contínuo como exemplo pode dar a  
entender que a indecidibilidade da Hipótese do Contínuo (CH) seria um  
"corolário da demonstracao" dos teoremas de incompletude, o que nao é  
o caso (a consistencia
de CH veio da construcao do modelo construtível, e a de ~CH veio da  
invencao do método de forcing).

Tem um livro recente do Torkel Franzen, "Incomplete guide for use and  
abuse...etc.", acredito que o Walter conhece este livro, assim como  
outros colegas também...  Nesse livro o autor (que aparentemente  
morreu há pouco) faz comentários bastante interessantes sobre este  
tipo de problemas. Os teoremas da incompletude nao impedem que alguém  
faca uma teoria sobre números e fantasmas que seja sintaticamente  
completa no que se refere a... fantasmas.

Antes de me despedir, levanto uma outra questao, já que falei no  
Torkel Franzen:

Ele tem uma visao interessante sobre o que é dizer que uma assercao  
(aritmética) A é verdadeira.

Ele diz que "A é verdadeira" é equivalente ao... enunciado de A.

Por exemplo, "A Conjectura de Goldbach é verdadeira" é equivalente a  
"Todo par maior do que 2 é soma de dois primos". Pronto, acabou, é uma  
afirmacao sobre números naturais.

OK, legal, mas concordam que ele está se referindo ao modelo standard  
? Que na verdade ele está se referindo a naturais standard ?

Pelo que percebi, isso acontece também quando se discutem teoremas  
como o de Paris-Harrington e o de Goodstein: dizer que "uma afirmacao  
é verdadeira e nao pode ser demonstrada" é dizer que "uma afirmacao é  
verdadeira no modelo standard e nao pode ser demonstrada".

Aí eu pergunto aos colegas: é consenso entre os filósofos da matemática que

fato aritmético verdadeiro = fato aritmético verdadeiro no modelo standard  ?

Se sim, acho que é por aí a nocao do Torkel Franzen.

Até mais,

[]s  Samuel











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