Caros. Acabo de receber esta notícia, que mostra que o CNPq começou a reagir. Antes tarde que mais tarde ainda.
https://www.instagram.com/p/C1118efOXf1/?igsh=YjA1aDN0dnFqcXZw []s Em seg., 8 de jan. de 2024 às 12:25, Hermógenes Oliveira < olive...@daad-alumni.de> escreveu: > Olá, Elaine. > > Em domingo, 7 de janeiro de 2024 às 11:27:00 UTC-3, Elaine Pimentel > escreveu: > > Oi, Hermógenes! > > no Brasil as coisas infelizmente ainda funcionam sob o pressuposto de que > o cuidado das crianças é responsabilidade da mãe. > > > E, na maioria dos casos, é mesmo! > > > Sem dúvida! > > Contudo, convém atentar para quando políticas públicas deixam de apenas > adequar ao cenário social presente e passam a reforçá-lo ou > retroalimentá-lo. > > Não é mais tão incomum ver papais cuidando de crianças pequenas. Também > não me parece justo que políticas públicas (além de pressão social e etc.) > continuem contribuindo para encurralar mulheres nesta função quando, em > muitos casos, seria mais propício um arranjo diferente. > > No Brasil, a licença paternidade é irrisória e a licença maternidade dura, > via de regra, apenas 120 dias, o que mal cobre o período recomendado de > aleitamento materno. Mas suponhamos, por um momento, que exista uma licença > para cuidado de crianças um pouco mais generosa. Mantê-la como licença > maternidade apenas reforçaria a mãe no papel de cuidadora, mesmo para > famílias nas quais outro arranjo seria preferível, simplesmente porque a > mãe é a única que pode usufruir de licença. > > Isto foi apenas um exercício hipotético que pouco afeta o que acredito ser > a medida correta tomada pelo CNPq neste momento. O objetivo é chamar a > atenção para alguns pontos relacionados. > > No caso da Alemanha, que conheço mais de perto, as semanas de licença para > cuidado da criança retiradas pelo pai possuem o mesmo peso daquelas > retiradas pela mãe frente a agências de fomento, como a DFG. > > > Nos casos que conheço de colegas alemães, os pais tomam, de fato, a > licença a sério e se recusam a fazer qualquer atividade formal (além de dar > aulas é claro, mas também escrever artigos, participar de congressos, > submeter projetos, fazer revisões de artigos e projetos...). No Brasil > conheço muitos poucos casos assim. Na verdade, conheço só um. > > Tenho um colega italiano, esposa também italiana, que disse que o melhor > momento produtivo dele foi quando a mulher teve filhos, porque ele pode > trabalhar mais. Ela nunca conseguiu uma posição na academia. Ele sim. > > Que tal a reflexão: quantas mulheres a gente conhece que tiveram filhos > antes de conseguir um emprego na academia? Quantas mulheres conseguiram > seguir com sua pesquisa após terem filhos? > > Acho que o simples fato de essa pergunta fazer sentido (como posta), e > pouco ou nenhum se trocarmos para "homens" diz muito sobre o problema. Que > é complexo, então não há análise simples. > > > É patente que mulheres são muitíssimo mais afetadas. Quase que > exclusivamente afetadas, na verdade. Contudo, ao menos no que concerne este > fator específico (existem outros fatores que desfavorecem pessoas do gênero > feminino, claro), o impacto desproporcional ao gênero feminino passa, > dentre outras coisas, pela expectativa (muitas vezes reforçada por > políticas públicas) de que o cuidado (de crianças, idosos, incapacitados e > etc.) é reduto da mulher. Creio que todos, incluindo homens e mulheres, > possam ser beneficiados por um arrefecimento do poder destes estereótipos. > Infelizmente, trata-se de algo muito arraigado. Mundo afora. > > Antes da minha pequerrucha nascer, li, não me lembro onde, algo escrito > pela Holly Krieger <https://en.wikipedia.org/wiki/Holly_Krieger>. Ela > dizia ficar agradecida sempre que seus colegas homens mencionavam sua vida > familiar num contexto profissional, tal como "Não posso participar da > reunião de departamento nesse horário, pois tenho que cuidar do meu filho". > Achei interessante e depois que minha filha nasceu, faço um esforço > consciente para não omitir sua existência do meu espaço profissional, o que > é sempre a minha inclinação inicial (isto com respeito a todos aspectos da > minha vida particular). Tem sido bastante revelador observar as reações. As > mais comuns são: perguntar casualmente (tangencialmente?) pela minha esposa > 🙄; entender que estou reclamando da minha condição de pai (curiosamente, > seu eu digo que não posso fazer algo por estar doente ou preciso comparecer > ao tribunal, ninguém assume, sem mais, que estou reclamando da vida). > > Minhas colegas mulheres estão certamente em condições muito piores e têm > toda a minha admiração. Ambientes de trabalho em geral não são muito > tolerantes à presença de crianças, o que é compreensível. Mas na academia > parece haver ainda um certo estigma associado a elas. Algumas colegas > chegam mesmo a esconder do espaço profissional o fato de serem mães. E o > estereótipo de gênero está sempre presente. Volta e meia, preciso > participar de reunião com a pequena no colo: eu recebo perguntas sobre a > minha esposa, enquanto minhas colegas mulheres que eventualmente trazem > crianças para as reuniões recebem comentários casuais sobre o horário de > funcionamento de creches (nada de "Como vai o seu esposo? Está > trabalhando?"). Durante a pandemia, fui hostilizado por aluno que ficou > incomodado com os ruídos envolvidos nos cuidados da minha filha durante > minhas aulas remotas (Cafofo sem escritório aqui. Também levando em conta > este episódio desagradável, não liguei o microfone para fazer minha > pergunta no encontro recente em Bristol, pois a pequena estava cantando > amavelmente em alto e bom som, e ninguém conseguiria escutar minha pergunta > mesmo). Acho que os colegas conhecem os episódios lamentáveis durante a > pandemia de mães sendo hostilizadas por patrões, juízes e/ou colegas de > trabalho por estarem amamentando ou cuidando da prole durante > videochamadas. Eu pude usar efetivamente do machismo arraigado para > convencer minha esposa a vagar pelas ruas desertas com a criança no colo > nos dias de aula com o tal cidadão. O mesmo não está disponível a uma > mulher que amamenta. > > Dado o contexto brasileiro, as medidas anunciadas pelo CNPq provavelmente > afetarão apenas as mães (ou talvez também pais com guarda exclusiva). > > > É um começo! Importante, porque atinge a maioria dos casos. > > > Sim, eu diria que não apenas é um começo, como o correto, dado o cenário > nacional atual. Uma situação mais ideal, como a que observamos com a DFG, > apenas faz sentido quando em consonância com as demais políticas públicas > em geral, como ocorre na Alemanha, mas não no Brasil. > > Acho que parte da tarefa de tornar o ambiente trabalhista brasileiro (não > só o acadêmico) um pouco mais adequado para pessoas com filhos passa por > uma reorientação das políticas públicas ao contexto familiar atual, onde > pais participam ou desejam participar de maneira equitativa no cuidado dos > filhos e famílias nas quais o cuidado das crianças é exercido por casais > homossexuais, para citar apenas alguns exemplos. > > > Concordo. Isso vai levar uma vida. Como a gente tem que começar de algum > lugar, que tal do mais óbvio? :) > > > O contexto brasileiro é bem distinto. Afinal, a situação de um novo pai > com uma rede de suporte local, uma esposa, uma babá e um escritório com > isolamento acústico dentro de casa é muitíssimo diferente daquela de uma > mãe solteira sem família num raio de mil quilômetros e que more num cafofo > de 50 m². Sabemos que temos colegas na universidade em ambos estes > extremos, bem como em diversos outros pontos no espectro. > > > Pra qual lado você acha que a balança pende mais? Eu diria que raramente > pra babá e escritório com isolamento acústico, ao menos no nosso ambiente > brasileiro. > > > Eu diria que o papai hipotético no seu escritório, na verdade, está em > condições invejáveis para *alavancar* a sua carreira, nos moldes do seu > colega italiano. > > -- > Hermógenes Oliveira > > -- > LOGICA-L > Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de > Lógica <logica-l@dimap.ufrn.br> > --- > Você recebeu essa mensagem porque está inscrito no grupo "LOGICA-L" dos > Grupos do Google. > Para cancelar inscrição nesse grupo e parar de receber e-mails dele, envie > um e-mail para logica-l+unsubscr...@dimap.ufrn.br. > Para acessar essa discussão na Web, acesse > https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/a2736198-009a-42a7-b492-a5399205d19dn%40dimap.ufrn.br > <https://groups.google.com/a/dimap.ufrn.br/d/msgid/logica-l/a2736198-009a-42a7-b492-a5399205d19dn%40dimap.ufrn.br?utm_medium=email&utm_source=footer> > . > -- Marcelo Finger Departament of Computer Science, IME-USP http://www.ime.usp.br/~mfinger ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1391-1175 ResearcherID: A-4670-2009 Instituto de Matemática e Estatística, Universidade de São Paulo Rua do Matão, 1010 - CEP 05508-090 - São Paulo, SP -- LOGICA-L Lista acadêmica brasileira dos profissionais e estudantes da área de Lógica <logica-l@dimap.ufrn.br> --- Você está recebendo esta mensagem porque se inscreveu no grupo "LOGICA-L" dos Grupos do Google. 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